sábado, 9 de setembro de 2023

Coluna do professor Trindade - e o verbo continuar segue sofrendo

 Vocês já perceberam que o verbo continuar foi “riscado”, definitivamente, “do mapa” pelo jornalismo brasileiro? Nada continua mais; tudo “segue”, como nesta manchete da Folha de São Paulo:

“Republicanos diz que, mesmo com ministério para integrante do partido, segue independente.”

É verdade que o verbo seguir pode, em determinados contextos, substituir o continuar; mas não em todas as situações. Ele não é um verbo de ligação, não pode vir acompanhado de predicativo.

Na manchete em questão, forçando muito a barra e com muito boa vontade, dá para aceitar. Mas o que dizer desta de O Globo?:

“Três meses após Lula receber Maduro, renegociação da dívida da Venezuela segue parada.”

“Segue parada” é demais!…

O correto seria usar o verbo continuar.

Aliás, O Globo está se tornando um campeão em impropriedade vocabular.

Mas o pior é que a coisa tomou proporções absurdas e somos perseguidos, frequentemente, por esse “segue”. Estou assistindo a uma série maravilhosa exibida pela Netflix, chamada “O Poder e a Lei”. Lá, também, nas legendas, tudo “segue”; nada continua.

Podemos também seguir os passos de alguém (no sentido de andar no mesmo ritmo), seguir uma religião (no sentido de aderir), seguir uma carreira (ingressar em uma determinada profissão), seguir um exemplo (no sentido de imitar um modelo ou uma ação) e seguir as leis de trânsito (no sentido de respeitar).

Argh!

O modismo do sofre voltou…

O(a) leitor(a) deve ter se perguntado por que a presença do verbo sofrer no título.

Justamente porque eu desejava falar sobre a volta do modismo de o jornalismo brasileiro usar o verbo sofrer, inadequadamente.

Por incrível que pareça, num passado recente, li, em alguns impressos e portais:

“Casa sofre assalto em Mangabeira.”

“Gasolina sofre aumento em João Pessoa.”

Ora; primeiramente, nenhuma casa pode ser assaltada; os moradores, sim. Esses sim, sofreram, mas com a invasão e o furto que houve. E o pior é que o texto deixava claro que os moradores estavam ausentes…

Quanto à gasolina, não teve ter “sofrido” aumento, mas deve ter aumentado ou ter tido aumento. O consumidor é que sofreu com aquele.

Nesse caso, seria muito mais simples e adequado escrever:

“Preço da gasolina aumenta em João Pessoa”.

Pois não é que, recentemente, deparei-me com a volta do “sofre” inadequado? Li, em algum Portal, de cujo nome não me lembro:

“Cantor fulano de tal sofre cirurgia”.

Ora, ninguém “sofre” cirurgia; é certo que a pessoa sofre por fazê-la. A redação mais adequada seria:

“Cantor fulano de tal é submetido a cirurgia”.

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